segunda-feira, 26 de junho de 2017

O uso de programas/softwares na gestão das propriedades

Por Ricardo Ferreira Godinho 
postado em 22/06/2017 em MilkPoint

uso de softwares para ajudar na gestão das propriedades por si só pode não ser a solução. Ajuda, sem dúvidas, mas, outras questões precisam ser consideradas antes de sua adoção para que eles não sejam utilizados de forma errada. Se isso acontece, normalmente há uma generalização e o usuário tende a achar que não funciona, que não deu certo ou não atendeu as expectativas.

Pesquisas realizadas nacionalmente apontam que os produtores rurais são resistentes quanto ao uso das tecnologias de informação e comunicação para auxílio na gestão. Por outro lado, existem também vários projetos e políticas públicas que visam ampliar suas utilizações, mas os produtores desconhecem ou não se interessam por essas ferramentas.

Nos fóruns de discussão do MilkPoint e do EducaPoint, observou-se um ponto que vai de encontro a estas pesquisas nacionais, pois por meio dos comentários dos leitores, se identificou que as pessoas às vezes têm receio de usar planilhas (e não necessariamente o caderno) porque acham difícil ou, acreditam que os funcionários não se adaptariam.

No campo, se nota que o uso destas tecnologias primeiramente tem que passar pela adoção de controles e pela utilização das informações que podem ser geradas. É preciso saber o que eu quero, para depois ir ao mercado em busca de um software que me responda ou auxilie nesta resposta, lembrando que as informações e as decisões de controle auxiliam para que uma fazenda não perca o foco, direcionando seus passos em prol de seus objetivos.

O uso de programas/softwares na gestão das propriedades

No caso de fazendas maiores, controlar é a função administrativa que se refere às relações interpessoais dos administradores em todos os níveis da fazenda com seus respectivos subordinados. No caso de fazendas menores, ou até mesmo sem funcionários, basta pensar nos “níveis administrativos/empresariais” os quais o produtor precisa pensar diferente em função de cada nível em que se encontra.

Controle pode ser definido como “o processo de produzir e usar informações para tomar decisões, sobre a execução de atividades e sobre os objetivos”. Implica em usar informações continuamente recebidas para tomar decisões que direcionem um determinado sistema ao objetivo desejado. A partir das informações obtidas no processo de controle é possível tomar decisões sobre:

- Que objetivos devem ser atingidos pela fazenda ou sistema de produção;
- O desempenho da fazenda ou sistema de produção em comparação com os objetivos definidos;
- Riscos e oportunidades no trajeto desde o início das atividades até o objetivo estabelecido;
- O que deve ser feito para assegurar a realização dos objetivos propostos;
- A eventual necessidade de mudar o objetivo estabelecido.


Tecnologias de informação e comunicação na agropecuária (TIC)
O termo informática é abrangente e engloba alguns componentes para o tratamento da informação, dentre eles a Tecnologia da Informação (TI) e o Sistema de Informação (SI). A tecnologia da informação surgiu da necessidade de se estabelecer estratégias e instrumentos de captação, organização, interpretação e uso das informações. É uma coleção de recursos, incluem pessoas, informações de uma organização e infraestrutura tecnológica.

Tecnologia de informação pode ser definida como sendo "todo e qualquer dispositivo que tenha a capacidade para tratar dados e/ou informações, tanto de forma sistêmica como esporádica, independentemente da maneira como é aplicada".  O potencial da informação depende do usuário e do uso que se faz dela, e uma série de características determinam o valor da informação para a fazenda:

- Precisa: sem erros – informações incorretas costumam ser geradas devido ao lançamento de dados incorretos como entrada no processo de transformação;
- Completa: contém todos os fatos relevantes no processo em análise;
- Confiável: dependente da confiabilidade dos dados de origem e dos métodos de coleta de dados;
- Relevante: importantes para os tomadores de decisão decidirem sobre um determinado processo ou decisão;
- Clara: deve ser simples – informações detalhadas e complexas não são úteis aos tomadores de decisão. Devem estar filtradas em quantidades compatíveis com as necessidades e as capacidades de processamento do tomador de decisão;
- Veloz: entregue quando necessária – nem antes, nem depois;
- Acessível: deve ser facilmente acessível por usuários autorizados, no formato adequado e no momento certo;
- Segura: acesso somente por pessoas autorizadas.


Um pesquisador brasileiro afirmou há quase duas décadas que “a informática ganhará cada vez mais espaço na gestão da empresa agropecuária, entretanto, deverá passar por significativas reestruturações de visual e funcionamento, em busca de maior simplicidade e interatividade para o usuário. Softwares que demandem menos esforços na coleta de dados a campo e que gerem resultados de fácil interpretação terão preferência”.

Em 2014, a Embrapa publicou um trabalho no qual afirma que nas próximas duas décadas, o setor agropecuário desempenhará, paulatinamente, um papel mais multifuncional. Se vislumbra maior dependência de conhecimentos, tecnologias e inovações. As interfaces entre as ciências agrárias e as outras áreas do conhecimento serão ampliadas. A velocidade das mudanças também se acelerará.

A implantação de novos sistemas de informação requer mudanças organizacionais. A informação tem-se mostrado uma ferramenta de alto valor estratégico para qualquer organização e a implantação de um novo sistema de informação, adequando às novas necessidades de flexibilidade e agilidade que o mercado exige, requer a realização das mudanças estruturais necessárias na organização.

Alguns sintomas comuns que evidenciam uma má coordenação da relação entre sistemas de informação e a organização têm forte relação com as pessoas, tais como o empregado que ignora o sistema por não ter domínio de sua utilização ou ainda, porque o sistema não atende às reais necessidades da fazenda ou usuário; o baixo moral dos funcionários afetados pelas mudanças estruturais e hierárquicas, e os resultados abaixo do esperado.

Para que estes e outros problemas não ocorram, devem ser considerados, no desenvolvimento de qualquer sistema de informação, os fatores como as particularidades de uma atividade (por exemplo: leite, agricultura, corte), o tamanho e a estrutura da fazenda, os controles já existentes e os que precisam ser implantados, a forma de entrada de dados e estilo gerencial. O estudo detalhado desses fatores, combinado com a análise das necessidades de informação da organização, estabelece uma base sólida para a definição do sistema de informações e das mudanças organizacionais necessárias.

Neste sentido, é preciso identificar aplicativos de sistemas de informação que se adaptem aos objetivos e às prioridades estabelecidas pela fazenda. É preciso considerar que algumas vezes os planos organizacionais não estão disponíveis ou não foram formulados, dificultando o alinhamento e o planejamento da tecnologia da informação. Ao basear-se somente nas propostas apresentadas pelos usuários, o projeto irá refletir os preconceitos existentes na empresa em relação ao uso do computador, bem como a atitude mais agressiva de alguns gestores em apresentar os conflitos de poder na fazenda.

Pesquisadores do setor de sistemas de informação apontaram que há uma clara tendência de que a adoção da tecnologia da informação e comunicação (TIC) na agricultura é reconhecida - pela maioria do público que participou da conferência European Federation Information Technologies in Agriculture, Foodand Environment (EFITA) - como um problema permanente.

De 2001 até 2013, em sete eventos consecutivos, os especialistas em agroinformática reforçaram essa realidade. Os participantes destes eventos foram questionados se têm problemas com a adoção de TIC na agricultura. Os que responderam “sim” variaram de 72% na edição do evento de 2001 a 96,7% em 2005, sendo que na edição de 2013, 78,9% dos participantes continuaram com esta afirmativa.

Nos Estados Unidos, no período de 2003 a 2013, verificou-se um crescimento no uso de computadores, que chegou a 70%. A utilização de computador nos negócios agrícolas também tem aumentado ao longo deste período, que saltou de 30% para 40%. Em 2013, o aumento foi de 65% com relação ao acesso à internet. .

No Brasil, os dados são muito defasados, pois o país utiliza - para caracterizar o produtor rural que tem acesso a computador e internet - os dados desagregados do Censo Agropecuário de 2006, realizado pelo IBGE. Segundo estes dados, no Brasil, o número de estabelecimentos agropecuários com computador variava de 1,16% (Região Nordeste) a 9,59% (Região Sul) e com acesso à internet, de 0,4% (Região Norte) a 3,95% (Região Sudeste). Provavelmente estes dados se alteraram muito nos últimos 10 anos se considerarmos a popularização dos smartphones, da internet móvel e rural e o aumento da quantidade de aplicativos disponíveis para estes equipamentos direcionados ao meio rural.

As ferramentas atualmente disponibilizadas pela tecnologia da informação e comunicação possibilitam que a gestão das fazendas seja aprimorada pelos gestores. Essas ferramentas auxiliam o processo de tomada de decisões reduzindo custos e melhorando a comunicação interna e com clientes, fornecedores e prestadores de serviços. Uma pesquisa publicada em 2004, apontou a existência de 34 softwares destinados à gestão e controle de atividades da pecuária brasileira. Já em 2008, outra pesquisa apontou a existência de 402 softwares para agronegócios, distribuídos em quatro categorias que abrangem várias cadeias produtivas do agronegócio: administração/gerenciamento, manejo animal, cultivo vegetal e controle de processo e/ou de atividades rurais.

Outro trabalho publicado em 2011 com dados de 2010 apontou um total de 1143 softwares para agropecuária e a categoria administração/gerenciamento concentrava 40,9% dos produtos; 25% eram para controle de processo e/ou atividades rurais, 20,6% para manejo animal e 13,5% cultivo vegetal. A quantidade de produtos dedicados à agropecuária é um reflexo da importância econômica e social do agronegócio brasileiro, juntamente com a evolução tecnológica e produtiva do setor.

Por meio da análise destes softwares e aplicativos no campo, as pesquisas constataram que os produtores rurais são resistentes quanto ao uso das tecnologias de informação para o auxílio na gestão e que eles têm dificuldades em utilizar e extrair o potencial dos sistemas de informações. Muitos produtores não conseguiram utilizar o potencial das ferramentas por desconhecimento conceitual relacionado a sistemas de gestão.

Por outro lado, o uso das tecnologias de informação por produtores alterou o comportamento perante a tecnologia, tornando-os menos receosos quanto ao seu uso. Alguns se tornaram mais motivados, curiosos e passaram a conhecer novas técnicas de informática e administração. Dados apontam ainda que os produtores ainda não perceberam que os computadores e programas de gestão são ferramentas úteis para a melhoria da gestão e que eles auxiliam no aumento da qualidade do trabalho e agilidade na execução das tarefas, além de melhorar a produtividade na gestão.

Nestas pesquisas, alguns produtores relataram que se sentiram inseguros com relação aos seus dados armazenados nos computadores. Embora tenham recebido informações sobre o controle de acesso e meios de armazenamento, esses produtores demonstraram não desejar compartilhar informações referentes aos negócios, mais precisamente informações financeiras, e temem que outros possam conseguir acesso se estiverem no computador.

Enfim, o uso deste recurso parece ser um caminho inevitável. Estas tecnologias estão cada vez mais presentes no nosso dia a dia, da alimentação do rebanho ao controle leiteiro na sala de ordenha, da identificação de animais doentes ao aleitamento de bezerras, do controle do leite entregue ao laticínio ao custo de produção, entre outros.

Ao adotá-las precisamos ter mais segurança quanto ao que queremos, considerar as pessoas que estarão envolvidas, a realidade da fazenda, a complexidade da tecnologia, a depreciação, entre outros fatores que julgarmos importante, para então realizar uma boa escolha entre as diversas opções disponíveis no mercado. Assim, aproveitamos ao máximo os benefícios e resultados que este tipo de tecnologia pode proporcionar.

Para saber mais sobre controles financeiros e gestão da propriedade, acesse o EducaPoint e participe dos cursos do instrutor Ricardo Godinho:

Planejamento da produção leiteira e Gestão financeira de propriedades leiteiras.


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Saiba mais sobre o autor desse conteúdo

Ricardo Ferreira Godinho    São João Batista do Glória - Minas Gerais

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