Em 29/03/2017
O que é preciso para garantir a permanência dos jovens no campo e, consequentemente, a sucessão familiar nas propriedades? Essa é uma questão que tem preocupado produtores, empresas e especialistas ligados ao setor. Muitos jovens rurais não querem ficar no campo, preferindo mudar para a cidade. Os principais motivos são a busca de oportunidades de emprego, além da mudança no padrão de vida, com maior facilidade de acesso aos meios de comunicação e a vida social urbana. Há também os conflitos familiares, que estimulam a preferência do jovem em prestar serviços em troca de um salário do que trabalhar dentro da propriedade - onde a remuneração pelo seu trabalho nem sempre é definida com exatidão.
A faixa etária da população do campo é alta e, com o passar do tempo e o envelhecimento dos pais, a tendência é que as propriedades sejam vendidas ou haja a transição da pecuária leiteira para outra atividade que demande menos mão de obra, como a pecuária de corte ou a silvicultura. A permanência do jovem no campo é também uma questão bastante complexa, pois envolve aspectos econômicos e sociais, já que é preciso que haja melhorias nos setores da saúde, educação e comunicação. Sucessão não é sinônimo de herança, mas sim uma obra contínua de modernização do negócio da família. Então, nada mais natural do que planejar e organizar o formato no qual haverá uma transferência do comando do atual responsável para um dos possíveis sucessores.
Para homenagear fazendas leiteiras que têm um histórico familiar, o MilkPoint está lançando o Especial Sucessão Familiar. A ideia, é entrevistar propriedades que deram certo e vêm se desenvolvendo ao longo de gerações. Para estrear, trouxemos a história da Fazenda Riachão, localizada no município de Major Isidoro, sertão do estado de Alagoas. O proprietário se chama José Rodrigues Neto e ele é engenheiro civil de formação, mas, devido a influência da sua tradicional família na pecuária de leite, não exerceu a profissão e ingressou na atividade em 1984, com 17 vacas e 75 hectares herdados de seu pai.
Rebanho da Fazenda Riachão
José sempre acreditou no diferencial do melhoramento genético e logo em 1986 foi a Minas Gerais comprar matrizes para compor a base genética do rebanho. Produtor de visão e preocupado com o futuro de seu negócio, o “seu Bedeu” como é conhecido, incentivou seus dois filhos a se aprofundarem na área, pois o negócio havia crescido e necessitava de uma administração mais técnica, já que surgiram muitos problemas administrativos e até financeiros.
Em 2003, seus dois filhos se interessaram pela área e foram morar em Viçosa/MG, ingressando na Universidade Federal de Viçosa (UFV). Um dos filhos, Guilherme Amaral, é bacharel em Tecnologia de Laticínios e o outro, Leonardo Amaral, é engenheiro agrônomo e especialista em pecuária leiteira pelo programa de formação de técnicos de um convênio da universidade.
Em 2013, Bedeu e Leonardo iniciaram um trabalho de dedicação diária e muito planejamento. Na sequência, passaram a colher bons frutos, pois a experiência na região, aliada a técnica e gestão econômica da propriedade, fizeram com que a fazenda - mesmo passando por anos de seca na região - crescesse ano a ano com sustentabilidade e apresentando um bom retorno do investimento. Neste mesmo ano, a fazenda, que possui 545 hectares, possuía um rebanho de 430 animais entre vacas, novilhas e bezerras. No total, haviam 155 vacas em lactação produzindo 1850 litros de leite/dia, sendo necessária a venda de animais para complementar a renda da propriedade. Atualmente, a Riachão detém 475 fêmeas com 195 vacas em lactação. A produção diária saltou para 3950 litros de leite com meta para produzir em 2019, 5500 litros.
Leonardo entre as palmas forrageiras
Segundo Leonardo, os fatores que levaram à expansão da fazenda foram:
- Estruturação do rebanho;
- Melhoria no acasalamento dos animais;
- Melhoria na nutrição e reprodução do rebanho e outros índices técnicos;
- Melhoria na produtividade dos volumosos; principalmente a palma forrageira, além de introdução do sorgo forrageiro, aumentando o suporte da fazenda;
- Trabalho de gestão de pessoas, além de remunerações mais dignas, o que acarretou em colaboradores mais engajados e eficientes com o serviço;
- Conhecimento do negócio a partir da gestão econômica de indicadores, facilitando a administração e tomadas de decisões.
A raça dos animais do rebanho é Girolando, com predominância dos graus de sangue 3/4 HZ e 1/2 HZ. “100% do rebanho é proveniente de inseminação artificial. O sistema de produção no período das chuvas (maio até agosto) é a pasto com suplementação concentrada no cocho (a recria e vacas secas ficam exclusivamente no pasto). No período das secas (setembro até abril), as vacas em lactação se alimentam de palma forrageira, cevada, silagem de sorgo e concentrado. O confinamento é explorado para as categorias de cria de bezerras e lote de novilhas em reprodução e o semiconfinamento para a recria e vacas secas”, pontuou Leonardo.
Rebanho da Fazenda Riachão
Processo de transição de gerações
De acordo com Leonardo, o primeiro passo para encarar esse desafio foi a busca pela capacitação na atividade leiteira aliada à visão empresarial que seu pai sempre teve. “Ele sempre buscou a evolução para se manter na atividade e tornar aquele patrimônio construído ao longo de sua vida um negócio viável e atrativo economicamente. Com o conhecimento e a prática adquirida em minha formação, junto às ferramentas de gestão, com números confiáveis na mão e diagnósticos da fazenda, consegui conquistar a confiança não só do ‘paitrão’, mas também, dos funcionários, que executam as atividades. Desmistifiquei a frase de que ‘santo de casa não faz milagres’. A transição vem sendo feita de forma gradativa. Todos os dias vamos para a fazenda e as responsabilidades estão sendo passadas de pai para filho ao longo do tempo. As tomadas de decisões são feitas de forma conjunta”, destaca.
Resolução de conflitos e a profissionalização da família
Na Fazenda Riachão, os envolvidos acreditam que em toda convivência, há divergências de opiniões, principalmente entre pessoas de gerações diferentes. Porém, eles optam pelo bom senso de ambas as partes - que com certeza querem o melhor para o negócio familiar. A profissionalização da família é feita a partir de leitura de artigos técnicos e informações de novas tecnologias, sendo discutidas entre técnico e o produtor. Também, é realizado um balanço ao final de todo ano agrícola, para ser discutido entre os membros da família os resultados técnicos e econômicos da propriedade. Os índices são comparados com fazendas eficientes da região Sudeste e assim, novas metas e melhorias são traçadas.
“A maior dificuldade que vejo na sucessão familiar é a situação econômica encontrada nas fazendas no momento da sucessão. Além disso, há uma desmotivação na visão dos sucessores que, ao encarar o negócio, concluem que alguém tem que deixar a atividade para uma boa remuneração, o que pode ser um fator impulsionador de conflitos. Por isso, é importante a capacitação dos sucessores. Nós não podemos ser vistos com um custo a mais quando saímos para a faculdade. Temos que ser encarados como uma ferramenta que resultará em melhorias, aumento de renda e lucratividade na atividade. Ambos os envolvidos podem ser bem remunerados, adquirindo a confiança de toda família”.
Para os proprietários que optarem pela sucessão rural em suas propriedades, Leonardo deixa um recado: “Capacitem seus filhos, pois eles podem sim fazer com que sua fazenda seja um ótimo negócio rural e deem sequência na bela missão de passar o legado da família de geração em geração. E aos sucessores, digo que a atividade leiteira já é caracterizada por altos investimentos para se produzir um litro de leite por dia, então, estratégias devem ser criadas para maior eficiência na utilização dos recursos já existentes”.
Capacitem seus filhos, pois eles podem sim fazer com que sua fazenda seja um ótimo negócio rural e deem sequência na bela missão de passar o legado da família de geração em geração Leonardo Amaral
Laticínio Tudo Bem
O leite produzido pela Fazenda Riachão é destinado ao Laticínio Tudo Bem, também pertencente à família de Bedeu. Hoje, a fábrica, que fica em Limoeiro de Anadia, conta com 13 funcionários e fez aniversário de um ano neste mês de março. O leite chega ao laticínio em caminhões adequados durante a noite e é processado em maquinário com tecnologia de ponta.
Os produtos são entregues a sete municípios alagoanos: Maceió, Arapiraca, Penedo, São Miguel dos Campos, Barra de São Miguel, Marechal Deodoro e Rio Largo. Com muita leveza, irreverência e ousadia, a Tudo Bem visa expandir a distribuição dos produtos para outros estados e também prioriza a diversificação da sua produção.
“Somos guerreiros”, diz Guilherme. “Nascemos com o sonho de levar produtos mais saudáveis e saborosos às pessoas, resgatando aquele gostinho fresco do campo. Nosso intuito é passar uma mensagem do bem, de maneira mais informal e carinhosa, com irreverência, inovação, preocupação com as pessoas, com os animais e com meio ambiente”.
Toda linha é fabricada com uma tecnologia pioneira no Nordeste, priorizando a redução de gordura, sódio e lactose zero. “Levar o bem para as pessoas é nossa missão. Essa é a nossa luta”.
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