terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Quando o leite dá dinheiro?

Publicado por MilkPoint
em 30/01/2016

produção de leite é uma atividade bastante heterogênea, com poucos parâmetros econômicos/financeiros padronizados que auxiliem o produtor a avaliar a performance do seu negócio ou mesmo o investidor, que pretende investir na produção de leite e busca referências objetivas que lhes permita simular cenários de rentabilidade para a atividade.

Isso é bastante diferente em outras cadeias do agribusiness brasileiro, como por exemplo, a soja. Nesta cadeia, o pacote tecnológico de produção é bastante definido (e difere pouco para as diferentes regiões produtoras), os custos de produção por hectare são públicos, bastante padronizados e monitorados, com razoável grau de assertividade, por organismos oficiais como a CONAB (www.conab.gov.br) e os níveis de produtividade por hectare são conhecidos. Assim, sem considerar as incertezas climáticas (também presentes no leite) e de mercado (ainda que, para o caso da soja, os preços futuros da Bolsa de Chicago sejam uma referência de mercado bastante difundida nas diferentes regiões produtoras), a atividade e sua rentabilidade são razoavelmente previsíveis.

Para tentar identificar padrões mínimos que ajudem a caminhar no sentido da parametrização financeira/econômica da produção de leite, utilizamos dados de 305 fazendas produtoras de leite no Rio Grande do Sul, monitoradas pela Transpondo (www.transpondo.com.br), empresa de consultoria dirigida por Wagner Beskow e parceira do MilkPoint Mercado. Usando dados anualizados, do quarto trimestre de 2015 ao terceiro trimestre de 2016, nesta primeira análise, utilizamos alguns parâmetros como a produção de leite/hectare/ano, a produção de leite diária e o investimento por litro de leite produzido, associando cada um deles ao resultado líquido por litro de leite (R$/litro). A primeira relação entre os indicadores é mostrada no gráfico 1, onde aparecem o resultado da atividade leiteira e a produção de leite por hectare por ano.

Gráfico 1. Resultado da atividade leiteira vs. produção por hectare. 

Resultado da atividade leiteira vs. produção por hectare.
Fonte: elaborado por MilkPoint Inteligência a partir de dados da Transpondo (www.transpondo.com.br).

Há uma boa relação (R2 = 0,84) entre a melhoria do resultado da atividade leiteira e o aumento da produtividade por hectare. Além da óbvia conclusão de maior aproveitamento do fator de produção terra (no cálculo deste resultado líquido é agregado o custo de oportunidade da terra), é interessante verificar que, para o período considerado, o resultado líquido da atividade, nestas propriedades, passa a ser consistentemente positivo (isto é, maior do que zero) somente em produtividades maiores do que 15.000 litros/hectare/ano. A mínima produtividade da terra associada a resultado positivo foi de 9.200 litros/hectare/ano. Este, portanto, pode ser um dos parâmetros a serem observados num sistema de produção já estabelecido ou em análises de cenários de novos investimentos em produção: deve-se buscar uma produtividade média acima de 15 mil litros/ha/ano para sistemas de produção de leite “vencedores”.

Um segunda relação entre as variáveis aparece no gráfico 2, que relaciona o mesmo resultado líquido da atividade leiteira com a escala de produção (em litros de leite/produtor/dia). Importante mencionar que a média de produção diária para os 305 produtores da amostra é de 935 litros/produtor/dia (o que é um volume médio elevado, mesmo para Rio Grande do Sul).

Gráfico 2. Resultado da atividade leiteira vs. volume por produtor por dia.
 
Resultado da atividade leiteira vs. volume por produtor por dia
Fonte: elaborado por MilkPoint Inteligência a partir de dados da Transpondo (www.transpondo.com.br)

O efeito de economias de escala na produção de leite aparece claramente aqui, apesar de uma relação causal um pouco menor do que a anteriormente analisada. Há muitos itens do custo de produção de leite diretamente associados à escala de produção – como, por exemplo, custos de remuneração de capital investido e manutenção de equipamentos (máquinas de ordenha, tanques de resfriamento, tratores, implementos, etc.). 

Adicionalmente, como indicam os sistemas de bonificação por volume utilizados pela maioria das empresas do mercado (e algo que também temos conseguido monitorar na prática, por meio das informações do MilkPoint Radar), há uma considerável diferenciação no preço pago ao produtor em função do volume comercializado. Assim, os melhores resultados por conta do aumento em volume de produção não são somente função dos menores custos, mas também da escala e dos melhores preços que esta propicia. Uma demonstração clara desta afirmação (ao menos para o caso destes 305 produtores no Rio Grande do Sul) é verificada no gráfico 3, que relaciona, com muito boa relação causal, o resultado líquido por litro de leite e o preço pago pelo produto.

Gráfico 3. Resultado da atividade leiteira vs. Preço por litro de leite.

Resultado da atividade leiteira vs. Preço por litro de leite.
Fonte: elaborado por MilkPoint Inteligência a partir de dados da Transpondo (www.transpondo.com.br)

Mesmo assim, se considerarmos a faixa de 1000-1050 litros diários, os resultados variaram de um prejuízo de R$0,34 a um lucro de R$0,28.

Finalmente, associamos o resultado líquido da atividade com o nível de investimentos na atividade leiteira (medido em R$ por litro de leite produzido, por dia). Este indicador dá uma ideia de quão bem ou mal dimensionada está a estrutura de produção existente na fazenda e quanto deve crescer o volume de leite produzido por dia para atingir patamares aceitáveis neste indicador. Observe o gráfico 4.

Gráfico 4. Investimentos (R$/litro de leite por dia) vs. Resultado da atividade leiteira.
 
Investimentos (R$/litro de leite por dia) vs. Resultado da atividade leiteira.
Fonte: elaborado por MilkPoint Inteligência a partir de dados da Transpondo (www.transpondo.com.br)

Há uma clara relação entre o nível de investimentos dedicados à produção de leite e o resultado líquido da atividade. O gráfico 4 indica que resultados maiores do que zero com investimentos menores do que R$ 2000/litro produzido por dia, e os melhores resultados líquidos, com níveis de investimento entre R$ 700 e R$ 800/litro de leite produzido por dia.

Estes números indicam que, no estado do Rio Grande do Sul, se precisaria buscar que os investimentos na produção de leite ficassem entre R$ 700 e R$ 800/litro de leite produzido por dia, com uma produtividade mínima de 15.000 litros de leite/hectare ano, buscando atingir volumes crescentes (de preferência já iniciando acima de 1.000 litros/dia) para maximizar as economias de escala inerentes à atividade leiteira. E, depois disso tudo, negociar preços mais elevados em função de um volume de leite crescente e de qualidade (parâmetro aqui não mencionado). Se esta não é a receita do sucesso na atividade leiteira, certamente é um bom começo.

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